No seu livro sobre "A origem da Família...",
Engels fala sobre um termo que alguns poliamorosos gostam de usar - punalua.
A família punaluana seria uma forma evoluída de modelo familiar - sendo que ele vai buscar o termo e exemplo a um costume havaiano - ainda dentro dos costumes de sociedades consideradas "bárbaras". É interessante ver como este modelo familiar tinha um traço fortemente matriarcal, já que, dentro destas famílias-grupo não era possível estabelecer a paternidade de uma determinada criança, mas era sempre possível estabelecer a sua maternidade. Este era um modelo de coabitação e cooperação em que os membros de um determinado grupo de homens se chamavam punalua entre si, e idem para cada determinado grupo de mulheres.
A análise de Engels leva-nos mais longe, analisando uma evolução nas estruturas familiares a par de progressos civilizacionais, e eis que chegamos ao modelo monogâmico.
Compreender este modelo é importante, creio, para termos uma perspectiva de quais as suas raízes. Porque se é verdade, como já referi várias vezes, que a monogamia pode ser praticada de uma forma igualitária e com respeito pelos direitos e deveres de cada indivíduo, é também verdade que só com a noção das raízes podemos começar a desmontar os processos de dominação que operam nessa esfera.
"se baseia na supremacia do homem, com o propósito expresso de produzir crianças cuja paternidade não possa ser disputada; tal paternidade inequívoca é exigida pelo facto de que esses filhos serão, mais tarde, herdeiros daquele pai. [...] O direito da infidelidade conjugal também se mantém adstrito a ele, quanto mais não seja pelo costume [...]"
Vemos actualmente ainda muitas provas de como resquícios destas ideias se mantêm no século XXI. Os homens são, estereotipicamente, os traidores por excelência, os principais preocupados com passar o legado da família (quanto mais não seja, o nome da família, que é o nome do homem).
Ora, se como tenho abordado, é o fechamento da relação monógama que, a contrario, institui a traição, é também ela que retira a possibilidade de cooperação e inter-relação presente entre punaluas. Essa relação não existe dentro de um modelo estritamente monógamo, embora possa, ainda assim, existir dentro de alguns modelos de poliamor em que existe um fechamento das relações a um determinado conjunto de pessoas.
E isso deixa-me, por estranho que possa parecer - porque deveria ser indiferente, não? -, triste. Fico triste porque tenho assistido muito de perto ao quão bela e forte pode ser uma relação entre punaluas, e questiono-me sobre que visão terá a posição mononormativa sobre estas pessoas que resolvem assumir-se como punaluas, que resolvem gostar disso, que daí retiram prazer e compersion.