sábado, 17 de outubro de 2015

Tertúlia "(re)pensar a sigla"

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A tertúlia "(re)pensar a sigla", organizada pelo grupo NOVA Equality, teve lugar a 16/10/2015. Inês Rôlo esteve em representação do PolyPortugal.

Podem ouvir a sua intervenção inicial aqui!


sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Reportagem sobre Poliamor na Revista Tabu

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A peça "Nós temos 7 amores. História de uma família poliamorosa" saiu no dia 16/10/2015 na revista Tabu, que vem com o Semanário Sol. Leiam aqui em baixo e partilhem!

terça-feira, 13 de outubro de 2015

Ser poly e marginal

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Imagina isto: estás a conversar. Uma conversa banal sobre uma coisa qualquer. Estás, sei lá, a falar sobre cinema, num café com malta que conheces mais ou menos e com quem até te dás bem, mas não são o teu círculo íntimo de pessoas. Conhecem-se há relativamente pouco tempo, ou até há algum mas nunca falaram realmente umxs sobre xs outrxs e conhecem-se superficialmente. Sabes que uma das raparigas do grupo tem um namorado, sabes que a outra é de não sei onde e que tem uma licenciatura em não sei o quê, e um dos rapazes joga futebol e gosta de sci-fi. Tens ali colegas, amigxs de amigxs que conheceste numa noite qualquer, foste ali tomar um café porque calhou. Ou então são colegas de faculdade, ou colegas de trabalho, algo assim.

Estão a falar sobre cinema. E tu viste o filme no outro dia com a tua namorada. E alguém diz “ah, tens namorada? Fixe.” e passam à frente, porque a malta até é evoluída, e continuam a conversar. Até estás com sorte, porque não fizeram comentários menos agradáveis que já ouviste antes. Decidiste arriscar falar um bocadinho de ti e correu bem.  Mas já estás a pensar estrategicamente, não sabes se é seguro falares muito mais de ti e estás, desde o início, a pensar se hás-de conversar à vontade ou não. Não que aches que as pessoas te vão atacar directamente, mas não sabes bem o que esperar.

Decides arriscar. Porque afinal estás ali com amigxs e faz sentido que fales de ti, certo? Gostas que partilhem coisas contigo e gostas de partilhar coisas sobre ti, porque é o que se faz quando se conhecem pessoas novas e estás a fazer amizades.

Então casualmente continuas a conversar, e contas que no outro dia foste ao cinema com a tua namorada e o namorado da tua namorada e mais algumas pessoas que fazem parte da tua vida e da tua família (que por acaso são companheiras do companheiro da tua companheira). Não te apetece propriamente dizer “fui ao cinema com amigxs”, porque isso não corresponde exactamente à verdade.

Isto tudo porque querias dizer que foste ao cinema, mas não querias estar a mentir ou ocultar coisas sobre ti e poder falar delas naturalmente. NATURALMENTE. Assim como a tua amiga entretanto disse que foi ao cinema com o namorado dela e a conversa passou à frente.

Mas, no teu caso, a conversa pára ali porque de repente as pessoas começam a perguntar-te coisas da tua vida privada, porque se esqueceram da conversa interessante que estavam a ter sobre cinema e a conversa passa a ser sobre ti. Aliás, não sobre ti: sobre a tua vida. A conversa na verdade gira à volta das pessoas que começam a fazer-te perguntas atrás de perguntas sobre a tua vida, não porque estejam interessadas nos teus sentimentos, mas porque querem satisfazer uma curiosidade mórbida qualquer que tenham sobre se lá em tua casa dorme toda a gente na mesma cama e se fazes orgias ao fim de semana. Não têm lá muita empatia. Começam a reduzir-te a ideias pré-concebidas e tu passas a ser vistx como um rótulo ambulante. Nada contra rótulos, atenção, mas tu sabes que és mais do que uma só coisa. Tens de fazer um esforço para descontruir na cabeça delas a imagem que criaram automaticamente de ti e que não tem nada a ver contigo só porque disseste uma coisa que, para ti, é simples de assimilar porque é a tua vida.

Não sabes exactamente o que fazer, porque a partir do momento em que falaste no assunto é como se tivesses uma espécie de dever de 1) provar que és uma pessoa decente APESAR DE TUDO; 2) responder a toda e qualquer pergunta que te façam sobre a tua forma “hippie” ou “hipster e contemporânea” (ou, pior, “promíscua e psicopata”) de viver.

E tu queres falar sobre isso. Queres, porque é a tua vida, e queres partilhá-la, e até te dá algum gozo falar de ti, falar de coisas não-normativas. É fixe dizeres que és diferente. Mas também não queres falar sobre isso. Porque te apercebes de que as perguntas que te fazem não são perguntas de pessoas que se preocupam com o teu bem estar, ou pessoas que gostam de ti pelo que és. Mas porque te transformas num objecto de estudo, de fetichização, de estranheza, de exotismo, o que for.

É giro. Até certo ponto. A partir de determinada altura, torna-se cansativo. Esgotante. Irritante… Ofensivo. Agressivo. Queres poder ter uma conversa sem teres de sair de um armário de todas as vezes. Sem teres de “admitir” alguma coisa. Sem haver uma pausa na conversa em que de repente tu dás uma aula sobre a tua forma de viver, de ser, de estar.

De todas as vezes, tens de fazer várias escolhas: 1) evitar assuntos sobre a tua vida ou 2) abordá-los, tendo a noção de que podes ter A) reacções activamente agressivas ou B) teres de explicar exaustivamente tudo o que se passa na tua vida e responder a perguntas que, por bem intencionadas que sejam, sejam invasivas e ofensivas. Ou C) não responder a absolutamente nada e passar à frente, e depois lidar com as reacções das pessoas que acham que lhes deves uma explicação.

Entretanto já nem te lembras do que estavam a falar. Ah, de cinema. Então tu foste ao cinema com a tua namorada, o namorado dela, as namoradas do namorado dela. A tua família. E falas do filme, mas parece que as pessoas nem te estão a ouvir porque, na cabeça delas, ainda estão a fazer uma série de perguntas.

Depois pensas que se calhar talvez não seja melhor mencionares outros aspectos menos normativos da tua vida, tipo questões de género, activismo, feminismo. Se calhar é melhor também não falares sobre coisas que tenham a ver com foder, porque provavelmente também vais ficar com o rótulo de galdéria (pelo qual tu até tens um certo carinho, mas é melhor não lhes responderes isso de qualquer das maneiras).

Tu só querias falar sobre a merda do filme.

Depois vais-te afastando lentamente das pessoas porque não encontras propriamente tema de conversa, uma vez que todos aqueles que são temas centrais da tua vida te passam pela cabeça e ficam presos no filtro de “é melhor não puxar este assunto”.

Voltas àquele círculo pequenino e bom e fofinho das pessoas que te são íntimas e são parecidas contigo e refilas com elas e queixas-te de que, pela quinquagésima vez, não te sentiste à vontade no café que tiveste. E elas abraçam-te e compreendem-te porque passaram exactamente pelo mesmo.

Isabel Martinez