Segue-se uma abordagem possível a uma questão que, para mim, é relativamente recente, e que disfarça alguma hesitação brincando um pouco. Sem a moralina do costume, sem as vacinações institucionais a que nos vamos sujeitando, na fúria classificatória que nos desvia de ser pessoas para nos transformar em coleccionadores de borboletas, a intenção que aqui se oculta passa pela denúncia da imposição de modelos, que oprime, exclui — e não brinca em serviço. Peço que leiam, pois, este post como uma espécie de foreplay a qualquer coisa mais séria; como um pré-texto escrito para mais do que um/a… E que poliamorosamente vos dedico.
Desde a passagem do poli…teísmo para o monoteísmo, o culto fetichista ao número Um cresceu exponencialmente. Fantasma fundador, a unidade começa a confundir-se com perfeição; e porque uma relação pressupõe sempre mais do que um (sendo o meio uma evidente limitação biológica), o dois, por proximidade numérica e facilidade fusional, lá se institui. O sacrossanto Um, reinando então sobre tudo, vai de confundir as relações entre pessoas com uma espécie de leite achocolatado: quanto mais uniforme, indistinto — concordante e enjoativo — melhor se amanha a beberagem! E com o alto patrocínio da Igreja, lá se encorajam as relações Nesquik, mexidas com a ampla colher do sr. Bispo, que homem nenhum pode apartar. Mais do que o poli, o que perturba este esquema instituído é mesmo a liberdade.
A liberdade tem esta propriedade incomodativa de enguia esquiva, que coloca em perigo qualquer finalização institucional. Numa passagem que sempre me intrigou, Sartre alerta, com acutilância quase cínica, para a impossibilidade do amor realizado devido a este absoluto a que se chama “liberdade”.
Se eu desejo alguém (ainda mais quando esse desejo ganha o qualificativo difuso a que chamamos “amor”), eu admiro e ambiciono a sua liberdade, não para a reduzir mas para que ela permaneça. Ora isto coloca a relação num limbo difícil. É que se eu conquisto realmente essa liberdade, acabo por anulá-la, perdendo-se o desejo numa lógica de subjugação; se ela persiste, o desejo lá se mantém, combativo e difícil, sem fusão ou solução. Poli ou não poli, o que cai aqui por terra é a chamada relação Nesquik, tão propalada pela cristandade, pelo reino das consciências casamenteiras e pelas samaritanas parteiras que por aí pululam, dizendo sins à vida. Ainda por cima a partir de um livro intitulado Ensaio de ontologia fenomenológica, escrito por uma das pessoas que mais realizadamente viveu numa relação aproximada ao “modelo” poli — très chic, não é verdade?!
Independentemente do argumento de Sartre, gostaria de vos dizer, agora um pouco mais a sério: Sou professor de Filosofia, assumindo desde logo uma responsabilidade pública no combate aos vários autoritarismos encapotados pelo bom nome da “moral”. Não que ela não seja necessária, mas porque o sentido de uma moral passa pela sua refundação. Que ela se exalte, pois — poliamorosamente ou não —, contra as relações Nesquik, cujo carácter modelar todos os dias constrói vítimas. Entre elas, em acto ou em potência, estamos todos: eu e vocês.
Desde a passagem do poli…teísmo para o monoteísmo, o culto fetichista ao número Um cresceu exponencialmente. Fantasma fundador, a unidade começa a confundir-se com perfeição; e porque uma relação pressupõe sempre mais do que um (sendo o meio uma evidente limitação biológica), o dois, por proximidade numérica e facilidade fusional, lá se institui. O sacrossanto Um, reinando então sobre tudo, vai de confundir as relações entre pessoas com uma espécie de leite achocolatado: quanto mais uniforme, indistinto — concordante e enjoativo — melhor se amanha a beberagem! E com o alto patrocínio da Igreja, lá se encorajam as relações Nesquik, mexidas com a ampla colher do sr. Bispo, que homem nenhum pode apartar. Mais do que o poli, o que perturba este esquema instituído é mesmo a liberdade.
A liberdade tem esta propriedade incomodativa de enguia esquiva, que coloca em perigo qualquer finalização institucional. Numa passagem que sempre me intrigou, Sartre alerta, com acutilância quase cínica, para a impossibilidade do amor realizado devido a este absoluto a que se chama “liberdade”.
Se eu desejo alguém (ainda mais quando esse desejo ganha o qualificativo difuso a que chamamos “amor”), eu admiro e ambiciono a sua liberdade, não para a reduzir mas para que ela permaneça. Ora isto coloca a relação num limbo difícil. É que se eu conquisto realmente essa liberdade, acabo por anulá-la, perdendo-se o desejo numa lógica de subjugação; se ela persiste, o desejo lá se mantém, combativo e difícil, sem fusão ou solução. Poli ou não poli, o que cai aqui por terra é a chamada relação Nesquik, tão propalada pela cristandade, pelo reino das consciências casamenteiras e pelas samaritanas parteiras que por aí pululam, dizendo sins à vida. Ainda por cima a partir de um livro intitulado Ensaio de ontologia fenomenológica, escrito por uma das pessoas que mais realizadamente viveu numa relação aproximada ao “modelo” poli — très chic, não é verdade?!
Independentemente do argumento de Sartre, gostaria de vos dizer, agora um pouco mais a sério: Sou professor de Filosofia, assumindo desde logo uma responsabilidade pública no combate aos vários autoritarismos encapotados pelo bom nome da “moral”. Não que ela não seja necessária, mas porque o sentido de uma moral passa pela sua refundação. Que ela se exalte, pois — poliamorosamente ou não —, contra as relações Nesquik, cujo carácter modelar todos os dias constrói vítimas. Entre elas, em acto ou em potência, estamos todos: eu e vocês.
Hugo Monteiro
3 comentários:
Numa palavra, Fantástico
noutras palavras, bom conteúdo!
mas uma complicação na forma que dá nojo de ler... levei 3 tentativas para ler essa coisa tão intragável.
Caro Anónimo:
O contraditório é bem-vindo neste blog, desde que minimamente clarificado e escrito sem linguagem ofensiva.
Caso tenha coisas a dizer sobre poliamor, com linguagem e forma legível, o espaço de convidados está aberto aos Sábados. Poderá enviar o seu texto para polyportugal@gmail.com
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