Quando existe uma relação monogâmica e alguma das partes tem o poliamor em consideração, é necessário avaliar e ouvir ambas as pessoas. Nunca quis fazer da minha escrita um guia prático para o poliamor. Este deve ser vivido consoante as pessoas. Podem existir coisas comuns em todas as relações (poly ou mono) no entanto a experiência molda as pessoas e as circunstâncias. A forma como vivemos as nossas relações vai depender de nós enquanto Pessoa - da nossa bagagem. Vai depender das Pessoas com quem pretendemos ter uma relação - da vivência delas. O tudo de todos resultará no que pretendemos enquanto base e enquanto regras. Em vez de abordar da monogamia ao poliamor, vou falar da minha monogamia ao meu poliamor.
Tinha uma relação monogâmica estável, bonita e com uma comunicação excelente. Acredito, no meu caso, que esta base tenha sido essencial para avançar. Quando por iniciativa minha partilhei a possibilidade de passar de uma relação mono a uma relação poly, só recebi lágrimas. É isto que nos é dado desde sempre: nós somos de uma pessoa; essa pessoa é nossa. A possibilidade da não-exclusividade vai afectar a ideia de posse. Esta posse foi algo que sempre me assustou em qualquer relação que tivesse. O choro que recebi foi um medo que me pareceu sempre legítimo. Não podemos simplesmente arrancar de alguém, algo que lhe foi imposto socialmente. Pode ser trabalhado - foi trabalhado, nunca arrancado.
A negociação foi imprescindível. O que é ser poly? Onde é que isso nos pode afectar? Já não me amas? Amo, por isso é que quero ficar, só não quero viver o meu amor de forma exclusiva. E amava - e amo. No entanto o meu amor não era exclusivo nem foi comprado ao peso. Não me foi atribuída uma quantidade ou medida quando nasci e tive que o aprender a partilhar de forma equilibrada. Não. É auto-suficiente; cresce. O meu amor existe em abundância. Não tem que nos afectar, temos é que conversar. Muito. Abracei o medo da Pessoa com quem estava e ela abraçou-me a mim juntamente com o medo dela. Não são só Primaveras de paixões; não somos só marés de amores loucos. Sofremos - é uma particularidade de se existir. Poliamor não é - nunca será impingir uma ideia de amar a alguém. Não é - nunca será obrigar alguém com quem temos uma relação monogâmica a viver uma relação poly se isso não lhe fizer qualquer sentido. Obviamente que se a monogamia não for para nós e alguém não quiser abdicar dela podemos optar por: ficar ou não ficar. Não podemos é optar pelo que vamos dar a viver a alguém se não trouxer felicidade.
Parecia tudo pouco real até acontecer eu estar numa relação além da que já tinha. As dúvidas e os medos apareceram com mais força mas o que incrivelmente apareceu também, foi uma comunicação e uma sensação de aproximação incrível. Novamente teve que existir uma negociação, agora com a Pessoa que aparecia na minha vida. Embora esta relação não se mantenha por diversas questões que afectam relações sejam elas quais forem, que afectariam mesmo uma relação monogâmica, não deixou de me trazer várias ferramentas para viver o poliamor e para viver o amor - com ou sem poly. Somos aprendizagem constante. A Pessoa com quem iniciei uma relação monogâmica e com a qual avancei para uma relação de não exclusividade mantém-se na minha vida. A comunicação melhorou. O sentimento de posse afastou-se e deixou-nos viver a possibilidade de amar com novas perspectivas. Connosco, mantém-se a certeza do respeito. Mais tarde, surge em mim um novo amor. Algo que vivo de uma forma maravilhosa actualmente, estes dois amores. Mais negociações. Mais medos. Mais regras. O resultado desta viagem da monogamia até aqui, é ver um sorriso em todas as partes envolvidas. É existirem planos e coisas pequeninas que me enchem o coração. Saber que estamos a trazer coisas novas para a vida uxs dxs outrxs. Este percurso resultou em partilhas enormes. Partilhas que me fazem ter a certeza de que o meu amor não só é infinito, como também o é o respeito das Pessoas com quem estou.
Amar é sempre demasiado complexo. É o que nos motiva a escrever poemas; a viajar por um abraço. Chorar com a chuva; não dormir. Amar é uma entrega constante. É o que nos descreve enquanto Pessoas loucas. É o que pensamos ser sempre uma justificação. Um argumento. O que temos sempre medo de dizer é que é sim uma negociação. Existem regras. Quando se ama - quando o amor é reciproco, o que escolhemos fazer com ele é legítimo desde que todas as Pessoas envolvidas estejam confortáveis e de acordo. Se isso acontece, então temos a liberdade de transformar as nossas relações em poemas. Em viagens. Podemos chorar com a chuva e ficar acordadxs noites seguidas só para ouvirmos alguém ou algu(éns). Se o que acontece é um amor que respeita: então não existe nada que não o possa fazer crescer. De cada vez que afirmo o poliamor ser meu - afirmo que estou a aceitar, a viver, a respeitar e sobretudo a dar legitimidade aos meus sentimentos e aos sentimentos de qualquer Pessoa envolvida. De cada vez que afirmo o poliamor ser meu - afirmo estar consciente de que é uma decisão minha respeitar outras decisões que não são minhas mas que tenho o direito de manifestar o que isso me faz sentir. Este amor, este amor é meu. Não sou apenas eu que escrevo poemas e que faço viagens impensáveis. Mas dentro de mim, individualmente, sou eu que luto todos os dias para não fazer do amor uma justificação. Um argumento falhado. Um sentimento constante de posse. Nem sempre consigo - mas foi minha a decisão de trabalhar e negociar comigo mesma todas as formas possíveis para desaprender o que me foi ensinado e reaprender o respeito e a partilha.
1 comentário:
Gostei bastante do post
Gostaria de me esclarecer/"desconstruir" mas
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