Nunca o provérbio “se não os podes vencer, junta-te a eles”
fez tanto sentido. Não que eu queira vencer alguém, mas é a frase que me vem à
cabeça cada vez que penso no que aconteceu este último mês. Sempre fui ciumenta.
Quando estava numa relação, essa pessoa era minha e só minha, eu dela e só
dela. Compreendia o poliamor, lutava pelo direito a amar mais do que uma
pessoa, mas tinha a certeza que nunca iria embarcar numa relação a três,
quatro, muitos. Ah, não. Achava que não era para mim. Que os meus ciúmes não
iam nunca permitir uma relação deste tipo.
Quando surgiu a oportunidade de passar umas semanas numa
comunidade de amor livre (que por razões de privacidade não vou identificar,
tal como não me vou identificar), a minha mente e o meu coração fecharam-se.
“Estou numa relação, por isso não vou procurar nada nem deixar que aconteça”,
foi a resposta que dei ao meu namorado. Ele pediu-me que deixasse as portas
abertas, que se o meu coração se fechasse ao exterior também se fecharia a ele
(talvez?). Eu, na minha posição de fazer finca-pé, assegurei-lhe que nada se
iria passar, porque eu não queria.
Mas passou-se. Não se trata de uma questão de querer, as
coisas simplesmente acontecem. As minhas defesas foram caindo umas a seguir às
outras quando via uma certa pessoa da comunidade. Desejava-o, gostava de estar
na companhia dele e cada pequena acção me parecia um sinal. O simples facto
dele se vir sentar junto a mim na esplanada ao jantar, quando podia ter
escolhido dezenas de outros lugares, era para mim uma espécie de vitória. E eu
seduzia-o. Fazia-o, mas sempre pensando que não iria passar daí, “porque eu
tenho namorado à minha espera lá fora”. Aos poucos, apaixonei-me.
Telefonei ao meu namorado e falei-lhe do que sentia. Ele
apenas me perguntou “se gostas dele, porque é que estás com tantos receios?
Tens medo da minha reacção? Então porque me ligaste a contar? Vai em frente. Eu
apoio-te, o meu amor por ti não muda, tal como espero que o teu por mim não
mude”. Mas alguma coisa estava presa na garganta. Queria falar com o outro
homem, mas as palavras não saíam. Não foi preciso – naquele lugar basta ler a
expressão corporal e a minha brilhava como um anúncio de néon quando ele
passava. Deixei-me levar e, no dia seguinte, a primeira pessoa a quem contei
foi ao meu namorado. Ficou felicíssimo por mim, porque sentia que, naquele
momento, eu estava verdadeiramente feliz. Quando estamos apaixonadas, a paixão
não se dirige só à última pessoa de quem começámos a gostar. Estava apaixonada
pelo meu namorado novamente, de uma forma tão forte como se tivesse sido a
primeira vez que falávamos.
Entretanto voltei. Não sem antes falarmos sobre o que se
tinha passado. Ele sabe que eu tenho um relacionamento, eu sei que ele tem
outros relacionamentos, mais ou menos fugazes. E sei que ele vai deixar a comunidade
antes de eu lá voltar, que vai voltar ao seu país e ao seu trabalho. Que talvez
nem nos voltemos a ver. Mas a experiência ensinou-me muito. Não se trata de
dançar conforme a música que é tocada, mas sim de não fechar o coração nem a
mente. Amo-os aos dois – sim, é possível. E tenho saudades dos dois, tenho mais
saudades do meu namorado do que alguma vez imaginei ter, com ou sem uma
terceira pessoa. Estamos mais unidos que nunca – a relação passou a prova da
verdade, da transparência. Deixou de haver ciúme e desconfiança. E isso vale
mais do que tudo.
K.
K.
3 comentários:
Que bonito! Gostei imenso deste relato, fez-me lembrar algumas situações a algumas pessoas que conheci ao longo da vida. E como crescemos quando deixamos os sentimentos fluir e podemos ser, ser sem entraves nem mentiras. É isto o amor, para mim.
Sara Barbosa
É mesmo. E sinto que cresci tanto, tanto com esta experiência! Sinto-me uma pessoa melhor e capaz de amar mais e melhor, seja uma ou mais pessoas.
Obrigada
"Quando estamos apaixonadas, a paixão não se dirige só à última pessoa de quem começámos a gostar. Estava apaixonada pelo meu namorado novamente, de uma forma tão forte como se tivesse sido a primeira vez que falávamos." Gostei particularmente desta parte porque me identifico plenamente. É paixão pela vida!
Espero que sejas muito feliz :)
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