sábado, 2 de junho de 2012

Nunca

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Nunca o provérbio “se não os podes vencer, junta-te a eles” fez tanto sentido. Não que eu queira vencer alguém, mas é a frase que me vem à cabeça cada vez que penso no que aconteceu este último mês. Sempre fui ciumenta. Quando estava numa relação, essa pessoa era minha e só minha, eu dela e só dela. Compreendia o poliamor, lutava pelo direito a amar mais do que uma pessoa, mas tinha a certeza que nunca iria embarcar numa relação a três, quatro, muitos. Ah, não. Achava que não era para mim. Que os meus ciúmes não iam nunca permitir uma relação deste tipo.

Quando surgiu a oportunidade de passar umas semanas numa comunidade de amor livre (que por razões de privacidade não vou identificar, tal como não me vou identificar), a minha mente e o meu coração fecharam-se. “Estou numa relação, por isso não vou procurar nada nem deixar que aconteça”, foi a resposta que dei ao meu namorado. Ele pediu-me que deixasse as portas abertas, que se o meu coração se fechasse ao exterior também se fecharia a ele (talvez?). Eu, na minha posição de fazer finca-pé, assegurei-lhe que nada se iria passar, porque eu não queria.

Mas passou-se. Não se trata de uma questão de querer, as coisas simplesmente acontecem. As minhas defesas foram caindo umas a seguir às outras quando via uma certa pessoa da comunidade. Desejava-o, gostava de estar na companhia dele e cada pequena acção me parecia um sinal. O simples facto dele se vir sentar junto a mim na esplanada ao jantar, quando podia ter escolhido dezenas de outros lugares, era para mim uma espécie de vitória. E eu seduzia-o. Fazia-o, mas sempre pensando que não iria passar daí, “porque eu tenho namorado à minha espera lá fora”. Aos poucos, apaixonei-me.

Telefonei ao meu namorado e falei-lhe do que sentia. Ele apenas me perguntou “se gostas dele, porque é que estás com tantos receios? Tens medo da minha reacção? Então porque me ligaste a contar? Vai em frente. Eu apoio-te, o meu amor por ti não muda, tal como espero que o teu por mim não mude”. Mas alguma coisa estava presa na garganta. Queria falar com o outro homem, mas as palavras não saíam. Não foi preciso – naquele lugar basta ler a expressão corporal e a minha brilhava como um anúncio de néon quando ele passava. Deixei-me levar e, no dia seguinte, a primeira pessoa a quem contei foi ao meu namorado. Ficou felicíssimo por mim, porque sentia que, naquele momento, eu estava verdadeiramente feliz. Quando estamos apaixonadas, a paixão não se dirige só à última pessoa de quem começámos a gostar. Estava apaixonada pelo meu namorado novamente, de uma forma tão forte como se tivesse sido a primeira vez que falávamos.

Entretanto voltei. Não sem antes falarmos sobre o que se tinha passado. Ele sabe que eu tenho um relacionamento, eu sei que ele tem outros relacionamentos, mais ou menos fugazes. E sei que ele vai deixar a comunidade antes de eu lá voltar, que vai voltar ao seu país e ao seu trabalho. Que talvez nem nos voltemos a ver. Mas a experiência ensinou-me muito. Não se trata de dançar conforme a música que é tocada, mas sim de não fechar o coração nem a mente. Amo-os aos dois – sim, é possível. E tenho saudades dos dois, tenho mais saudades do meu namorado do que alguma vez imaginei ter, com ou sem uma terceira pessoa. Estamos mais unidos que nunca – a relação passou a prova da verdade, da transparência. Deixou de haver ciúme e desconfiança. E isso vale mais do que tudo.

K.

3 comentários:

Anónimo disse...

Que bonito! Gostei imenso deste relato, fez-me lembrar algumas situações a algumas pessoas que conheci ao longo da vida. E como crescemos quando deixamos os sentimentos fluir e podemos ser, ser sem entraves nem mentiras. É isto o amor, para mim.

Sara Barbosa

K. disse...

É mesmo. E sinto que cresci tanto, tanto com esta experiência! Sinto-me uma pessoa melhor e capaz de amar mais e melhor, seja uma ou mais pessoas.

Obrigada

carpe vitam! disse...

"Quando estamos apaixonadas, a paixão não se dirige só à última pessoa de quem começámos a gostar. Estava apaixonada pelo meu namorado novamente, de uma forma tão forte como se tivesse sido a primeira vez que falávamos." Gostei particularmente desta parte porque me identifico plenamente. É paixão pela vida!
Espero que sejas muito feliz :)