sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Amizades

Publicado por 
Intimidade. A amizade tem que ver com intimidade. A amizade tem que ver com amor. A palavra está lá, um bocadinho escondida... mas está.

Ouço dizer, à boca cheia, que as amizades têm que ser protegidas (do sexo, entenda-se). E que só assim é que se salvam as amizades. De contrário, as pessoas confundem tudo. Mas porquê? A confusão vem de se ultrapassar essa barreira arbitrária? Ou de pormos em jogo, por questionar, pressupostos sobre o bom sexo e o mau sexo? O bom carinho e o mau carinho?

Não pode um (ou dez) orgasmo(s) ser(em) (apenas????) uma demonstração de carinho? Quem traça a linha do sexo?

7 comentários:

angie disse...

A confusão virá de emoções transmitidas pela intimidade (ainda mais intíma, ou ultrapassando uma barreira como disseste), o que pode levar a uma falta de norte para uma ou ambas as partes. Se tens x pessoa que partilha a tua opinião com pessoa y, que está a entrar em território desconhecido, a probabilidade da pessoa y começar a confundir algo que é somente sexo entre dois amigos com uma relação amorosa ou com um momento de fraqueza que pode - ou não - levar a um afastamento da pessoa x é bastante alta. E antes de questionares a palavra fraqueza, ela está a ser usada por uma razão. Se estás emocionalmente triste, podes ver no carinho e preocupação dos teus amigos algo mais. E aqui sim, no geral, começas a traçar uma linha. Não do sexo, mas do carinho. O carinho pode ser demonstrado de maneiras várias, desde um simples afagar de cabelo até um (ou dez) orgasmo(s). Quem não vê como benéfico, e aqui podes inserir razões múltiplas (medo de afastamento, medo do desconhecido, falta de desejo, maneira assexuada como vê a pessoa, etc.), envolver-se sexualmente com alguém, começa a traçar uma linha do carinho. Até que ponto é que isto é amizade? A partir de que ponto está a indicação de que é algo mais? Será que por me parecer a mim algo mais, é para x também? Quero mais carinho ou sinto-me extremamente bem com a forma como a pessoa mo transmite agora? As coisas não são lineares. E a linha do carinho não é igual para todos. E isso é bonito. Senão saíamos todos da mesma fábrica e estava o caso resolvido.

Daniel Cardoso disse...

angie,

Algumas das coisas que dizes fazem sentido, na minha opinião. Há, obviamente, variadíssimas razões para que uma pessoa, numa determinada situação, não se querer envolver com uma outra e queira separar intimidade física de intimidade psicológica (se é que isto faz sentido).

O problema, porém, advém não desses casos específicos, mas da normatividade que rege as relações de amizade e sexo - e que não trata de casos específicos, antes prescreve comportamentos para casos gerais, categorizados. Por isso mesmo não posso concordar com a frase em que falas de probabilidades: essas "probabilidades" têm apenas que ver com normas sociais, que podem ser subvertidas ou contornadas, e não como características inerentes das relações descritas.

Porém, tenho que fazer uma nota: uma boa parte do teu post presume um factor, creio, que não faz sentido que exista numa relação de amizade: falta de comunicação e falta de franqueza. Essa confusão, esse medo, essas perguntas: todas elas são legítimas, claro, mas são legítimas como perguntas a ser feitas em voz alta, exactamente assim. E, numa relação de amizade, conta-se com levar daí resposta - a maneira mais eficiente de dissipar dúvidas.

Obrigado pelo comentário,
Daniel.

Marquesa do Sado disse...

Daniel,

Fiquei a pensar neste post e só agora te digo alguma coisa, porque nem sei bem se isto é importante. Tenho que te dizer, que fora de qualquer normatividade, não consigo de todo pensar em sexo com os meus amigos. É que simplesmente não me dão pica. E se houve vezes (raras) em que isto se misturou na minha particular existência, geralmente deu asneira. Num caso, o sexo foi realmente de fugir. Noutro caso, envolvi-me amorosamente com o meu amigo, sendo que no final, nem a nossa amizade restou (mas foi giro).

Tenho absoluta convicção de que deves ser amigo dos teus amores, sem o qual poderás deixar que vivam a sua vida independentemente (tenho problemas com esta palavra) da tua. Já do contrário, misturares essas coisas do erótico com os amigos, não estou nada convencida. Mas não sei dizer-te realmente o porquê. É como se sentisse químicas diferentes, que realmente não se misturam: química de amigo e química de amante. O carinho de que falas e que, se entendi, não distingues propriamente, eu vivo-o de forma absolutamente estanque. No entanto, pudor à parte, eu teria mais facilmente sexo com pessoas que não conheço assim tão bem, do que com os meus amigos com quem tenho enorme intimidade a nível psicológico, mas não a nível físico.

Não faço ideia o que isto significa.

Beijo

Daniel Cardoso disse...

Marquesa,

A experiência de cada um - minha ou tua - vale sempre aquilo que vale: muito e nada ao mesmo tempo. Muito, porque é profundamente política, e pode criar e inspirar outras experiências; nada no sentido em que daí nenhuma construção geral, nenhuma planta (penso agora em arquitectura) se pode realmente tirar. As diferenças de percursos vivem ao lado das semelhanças, e impedem que tiremos mais do que ideias, inspirações.

Assim sendo, não posso colocar em hierarquias a minha ou a tua visão (ou experiências). Estão absolutamente ao mesmo nível. Apenas procuro questionar os limites da experiência: o que nos privamos, e o que nos privam. Porque todas as experiências, tuas e minhas, têm uma base, um enquadramento, são algo mais do que naturais. Importa questionar os modelos, as semelhanças, as coerências estatísticas e a curva da distribuição normal.

E isso é importante para a minha experiência, e para a tua. Esta visão, que coloquei em cima, fará sentido para algumas pessoas, para outras não. Acho que o mais importante não é essa produção de sentido, mas os mecanismos - as tecnologias - usadas para produzir o sentido. O fim de tudo (juntar amizade e sexo, ou manter ambos estanques, ou sentir ambos como estanques) resulta de processos que, admito, me fascinam.

No fundo, trata-se apenas de colocar as cartas na mesa: cada um jogará a sua mão como melhor lhe aprouver. Obrigado por partilhares os teus insights e a tua experiência de vida com o mundo.

Beijos.

Marquesa do Sado disse...

A cada um o seu reino particular. Gosto!

É um prazer, Daniel.

António Lopes disse...

Olá,

"...numa relação de amizade, conta-se com levar daí resposta - a maneira mais eficiente de dissipar dúvidas."

Daniel, esta tua frase faz-me lembrar algo que disse a uma conhecida, quando ela me perguntou a propósito de um "amigo", como é que ela "adivinharia" se ele queria algo mais.

Eu respondi-lhe que, numa amizade, não temos de "adivinhar", apenas temos de perguntar :-)

--

Também me interesso por perceber os porquês no assunto amizade/sexo.
A ideia que tenho e que resulta da minha experiência (e da dos outros), é que juntar o sexo à amizade, costuma dar barraca.

E, pensando na coisa, tirando os problemas emocionais que surgem quando a coisa dá para o torto e que muitas vezes são difíceis de gerir, tenho a ideia que a mistura de sexo-amizade costuma dar problemas porque as pessoas envolvidas não encaram o sexo com a devida naturalidade.

Elas até podem dizer que é tudo muito natural e saudável, mas quando chega a altura de praticar essa naturalidade, metem-lhe um monte condições e barreiras que apenas complicam e que não existiriam se o sexo, para elas, fosse realmente tão natural quanto qualquer outra actividade entre amigos.

Afinal, se partilhamos a nossa intimidade emocional com um(a) amigo(a) e para mim, esse tipo de partilha é muito mais íntimo do que o sexo, porque não o sexo?

E se o sexo foi mau, bem, passa-se à frente ou, numa lógica de amizade usada para outras situações entre amigos, ensina-se a pessoa em questão.
;-)

Se houve amor ou paixão, dá-se um tempo (se for mesmo necessário) e depois retoma-se a amizade.

Mas, como diz o Daniel, creio que o importante é ter consciência que o que resulta connosco pode não resultar com outra pessoa, independentemente dos motivos e que ter uma postura frontal e honesta, costuma ser a melhor política :-)

Tchau

Menina da Praia disse...

Tal como a Marquesa, a maioria dos meus amigos não me dão pica; não seria provavelmente capaz de fazer sexo com eles. No entanto com um em especial tenho imensa química e desejo-o ardentemente. Ambos somos casados e acho que isso até prejudica a nossa amizade pois ele acaba por sentir o mesmo e não o admite abertamente o que me leva a reprimir e a esconder isso também. Lá se vai a honestidade e a frontalidade.