A Juventude Socialista Amadora convidou o PolyPortugal a co-dinamizar uma tertúlia sobre poliamor, junto com profissionais de várias áreas. E vai ser já no próximo sábado, dia 28 de Fevereiro, pelas 15:30. Acedam ao evento no Facebook AQUI para terem mais informações.
sábado, 21 de fevereiro de 2015
segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015
Cuidado com o engate disfarçado de "poliamor"
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Acredito que muita gente pense que sou uma espécie de "evangelista" do poliamor, e que passo o meu tempo a tentar converter gente a "transformar-se" em poly. Acho que mais depressa investia o meu tempo a tentar falar com pedras, tinha mais piada.
Algo que passo bastante mais tempo a fazer é a tentar afastar pessoas que conheço e que vêm ter comigo pedir-me conselho, do poliamor. Ou, vá lá, de pessoas que usam o poliamor como desculpa para fazer valer o seu privilégio e os seus interesses pessoais.
Aconteceu algo do estilo há alguns dias. Uma rapariga que conheço veio-me pedir ajuda porque um rapaz, interessado nela, queria estar numa relação "poliamorosa" com ela, sendo que ela se identifica como pessoa monogâmica.
Primeira coisa que eu lhe disse: não entres numa relação poly por ele, entra por ti, porque tu queres. Poliamor não é um sacrifício que se peça a alguém, tal como a monogamia não o deve ser. Mas foi na segunda coisa que eu lhe disse que acertei de facto na mouche. Disse-lhe que ela tinha que perceber muito bem, na prática, o que é que ele entendia como uma "relação poliamorosa".
Vou parafrasear algumas das coisas que - segundo ela - ele usou como argumentos para expor o seu ponto de vista:
Trata-se de perceber que nós, como seres sexuais mas também como parceirxs, queremos muitas coisas. A versão que eu gosto é aquela em que se tem um/a namorado/a com quem se está plenamente, e socialmente também. Mas se houver atracção por mais alguém, pode-se chamar essa pessoa para se 'divertir' com o casal... ou então haver um interesse que seja diferente do que é pelo parceiro primário, e aí fala-se sobre isso e está tudo bem, e acontece algo entre duas das pessoas, mas nunca há ciúmes porque sabe-se sempre que és tu que és amada... e depois pode-se partilhar os detalhes todos do que aconteceu, ou nenhuns se se preferir.Eu quando li isto tive quase um ataquezinho de coração. E disse-lhe qualquer coisa do género: "POR AMOR DA SANTINHA, CORRE NA DIRECÇÃO CONTRÁRIA MUITO BUÉ HIPER-MEGA DEPRESSA". Com caps lock e tudo. (Pronto, está bem, disse só "hmm...". Mas juro que pensei isto tudo.)
Isto é o que acontece quando malta hetero sem sensibilidade nenhuma para privilégio de género começa a usar o poliamor como desculpa para querer fazer das suas.
Ora senão vejamos:
- "Nós [...] queremos muitas coisas" - O rapaz abre logo a salva com uma generalização total para tentar justificar que, pronto, ele é simplesmente igual a toda a gente, e que portanto os seus desejos são naturais, e acabou a conversa;
- "A versão que eu gosto" - Há muitas versões, mas ao invés de falarmos sobre o que é que poderia ser o nosso ponto de encontro, entra-se logo com uma visão redutora com uma série de pacotes incorporados, nomeadamente...
- Parceirxs primárixs: mantém-se o "privilégio de casal" e abre-se uma avenida para o tratamento de outras pessoas, fora do casal, como dispensáveis, secundárias; nos casos em que surge algum problema, a opção por definição é proteger "o casal" e o resto das pessoas que se... lixem;
- Aproveitamento sexual: a primeira preocupação do rapaz foi poder usar qualquer interesse que exista para ter o seu fornecimento de ménàges a trois... esqueçam lá o quão estranho ou assustador é alguém começar a fazer planos sexuais com terceiras pessoas que nem sequer são tidas nem achadas para o caso, mas já têm o seu lugarzinho reservado... e nenhum voto sobre se aquilo que farão sexualmente vai ou não ser relatado a terceiras pessoas...
- Opções extra: a haver um encontro que não seja a três, supõe-se/define-se logo que vai ser à partida diferente do que se sente pelx "primárix"... porque obviamente toda a gente pode logo adivinhar o que vai sentir por pessoas hipotéticas que ainda nem sequer conheceu!
- "E está tudo bem e não há ciúmes" - Esta é parecida à anterior: "poliamor" é estar sempre tudo bem... claro... porque, mais uma vez, toda a gente sabe à partida o que vai sentir e como vai reagir e toda a gente sabe que basta carregar num botão e, puff!, lá se vai toda a programação mononormativa com que levámos a vida toda, e os ciúmes e as inseguranças...
Dis-pa-ra-te.
Não. Com pessoas "poliamorosas" destas, venham as relações monogâmicas saudáveis, críticas e auto-reflexivas.
PS - Não sou das pessoas que defende que "todas as formas de não-monogamia são fixes". Tal como nem todas as formas de monogamia são fixes. Qualquer estrutura relacional que sirva para roubar autonomia e entrar em jogos de manipulação (geralmente através de linhas hierárquicas, de privilégio, de "casal") não é fixe.
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